Capítulo IV
Desculpa, desculpa, desculpa, desculpa... – repetiu na sua cabeça infinitas vezes, sem no entanto ter a
certeza de ter articulado uma sequer palavra em voz alta.
O ecrã do iPhone estava completamente
estilhaçado.
Sentia-se completamente encarnada e inconcientemente
manteve a cabeça baixa para desviar o olhar dele.
- Eu pago! – disse ela, conseguinfo finalmente
falar, alto, por ter arrancado a frase com esforço.
Como pagaria não tinha a certeza, visto
que tinha de recorrer a truques de magia para que orçamento mensal lhe chegasse
para todas as despesas da casa (que o João não se sentia preparado para dividir
com ela, claro).
- Calma. Não precisas.
- Preciso, claro que sim! Tu foste mal educado,
mas eu fui uma besta. Quer dizer...desculpa, não te queria estar a chamar
mal-educado agora que já te parti o telemóvel e tudo devia era estar caladinha.
Tu...
- Calma. – Repetiu ele pegando-lhe nas mãos
suavemente ara que ela parasse de esbracejar. E tremer. Só ali se apercebeu que
estava a tremer. – Eu tenho seguro. Não me vai custar nada , tirando o
incómodo.
- A sério? Juras?
Ele acenou que sim e ela deixou-se cair na
cadeira novamente. Naquela manhã já tinha envelhecido dez anos.
- Agora deixa-me trazer-te um cházinho e
qualquer coisa a acompanhar que acho que o teu mal e fome.
O tom brincalhão dele, não diminui o embaraço
dela em nada e nem conseguiu fingir um sorriso. Felizmente, ele tinha-os de
sobra.
Passaram quase duas horas a conversar enquanto
ela penicava o tal do brunch aos poucos – e ele também. Começaram por falar de
coisas tão corriqueiras como o tempo – a tentativa dele para a acalmar e fazer
esquecer do episódio anterior – e acabaram a trocar piadas (ele tinha um
portfólio impressionante).
- Até que enfim que te oiço uma gargalhada! –
notou ele.
E ela contou-lhe como o seu pai lhe contava
sempre as mesmas anedotas e ela se ria sempre. Então falaram da família, do
trabalho. O café era dele, deixou-lhe a mãe essa reponsabilidade antes de ir em
busca de uma oportunidade de trabalho no Luxemburgo. E ele tirou férias do
desemprego que experimentava desde que terminou o curso de arquitetura – e
depois de alguns estágios desapontantes em todos os sentidos – e aceitou o
desafio.
No final, ela tinha a alma dois quilos mais
leve, mas só a alma: estava certa de ter comido o equivalente ao seu peso
durante aquele par de horas. Quis pagar e ele não deixou. Insistiu que, se ela
quisesse, pagaria o jantar, num sítio à escolha dele.
De alguma forma, durante toda a conversa ela
nunca mencionara o João. E sem pensar mais no assunto aceitou as condições do
Rodrigo. Era esse o nome do moço do café a quem ela partira o iPhone.
Post mensal escrito pela blogger Maria do blog «Maria das Palavras» (http://daspalavras.blogs.sapo.pt/) em parceria com este blog!
Pronto, está resolvido. Vai-se o João e fica o Rodrigo!
ResponderExcluirA Maria tem muito jeito:) Gosto muito de a ler:) obrigada ás duas :)
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